21 outubro 2011

Sobre corrupção e garantismo

A questão da corrupção e o garantismo

                                  
                                      Por Tarso Genro

(Discurso proferido na abertura do congresso sobre corrupção, realizado pelo Ministério Público do RS nesta quinta-feira (20), em Porto Alegre/RS).

Devo arriscar uma investida na filosofia, em primeiro lugar, para refletir sobre a categoria da “mediação”. Não sendo um acadêmico e muito menos um filósofo posso dar uma contribuição limitada neste terreno, mas devo arriscar para perseguir de perto a clareza na minha exposição.

A “mediação” é uma categoria filosófica que está no centro da teoria epistemológica, logo é um artifício dialético, é uma construção “pensada” para, através de um ardil da inteligência, aproximar sujeito e objeto, fato e norma, conhecimento e ação. A mediação pode ser física, epistêmica ou lógica, mas sempre supõe vínculos com um imediato ou uma preparação do pensamento para desvendar ou interferir sobre um determinado objeto.

As instituições do Estado fazem a “mediação” entre os direitos da cidadania (seus direitos subjetivos) e os direitos fundamentais, sobre os quais se ergue a constituição política. A arte faz a mediação entre a experiência do sujeito tomado na sua singularidade e as questões universais do gênero humano. Os partidos são os mediadores políticos das dos grupos sociais, para ações e pretensões sobre o Estado. O Ministério Público é o mediador, entre a pretensão punitiva do Estado e o fato delituoso ou uma pretensão do sujeito individual ou coletivo. A mídia (mídia – mediação), faz a mediação entre o fato acontecido e o seu conhecimento pelo público. A mediação, portanto, como categoria epistemológica, é uma engenhosidade dos humanos para promoverem a socialização da sua humanidade. (...)

Tratar seriamente da questão da corrupção na atualidade, principalmente nos países do capitalismo tardio exige, portanto, uma espécie de “pré-compreensão” racional do significado da corrupção, ação perversa que não aceita a mediação contida nas instituições públicas para alcançar um determinado fim.

E isso se torna mais problemático no âmbito da política particular do Estado de Direito Democrático que vivemos: um Estado de Direito jovem, numa formação social de capitalismo tardio, ordenado por normas constitucionais de efetividade limitada. (...)

Os aparatos de investigação nas ditaduras e os tribunais de exceção, que lhes eram correlatos, foram substituídos por tribunais de fato, de caráter midiático. Suas “investigações” são feitas pelos repórteres competentes ou incompetentes, mas sempre ansiosos por evidência profissional. Os resultados são comentados por indivíduos que, independentemente das suas convicções pessoais, são agentes do mercado de informações, que excepcionalmente dispõem de algum conhecimento de Direito Penal e que fazem o seu trabalho sempre em contextos altamente politizados. Nestes, os grupos midiáticos assumem posições políticas de antagonismo ou de favorabilidade a determinados governos ou partidos, tratando com “medidas” diferentes seus aliados ou supostos inimigos.

A corrupção passou a ser o principal elemento da agenda política, que deixa em segundo plano a questão da tutela do capital financeiro sobre a vida pública e o Estado, as políticas de extinção ou redução dos direitos sociais, o sistema político e eleitoral que alimenta a corrupção, os crimes dos Estados ricos cometidos contra as suas antigas colônias e outras questões chaves para a efetividade do pacto democrático. Esta é a grande questão que enfrenta o Ministério Público e todos aqueles que querem efetivamente combater a corrupção no país, que, neste processo, foi nobremente transformada em “crime político”. (...)
-CLIQUE AQUI para ler a íntegra do discurso do Governador gaúcho Tarso Genro (via Sítio Sul 21).

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